Anestesia

     Este trecho não será narrado por uso da razão, nem do coração. Apenas narrado.
     Sinto-me honrada e orgulhosa por estar anestesiada agora.
     Lembro-me do suor em câmera lenta descendo no rosto gélido de ansiedade e susto. No respirar ofegante de todo o meu corpo. Sinto-me orgulhosa do remédio das madrugadas e pela força irreparável, quase em todas as vezes, que sinto quando nas madrugadas entristecidas, acordo repentinamente, pensando que já estou em outro lugar sem ser o real.
    É simples. Em uma dessas madrugadas, tive um sonho. Não só um sonho, seria.. o pior sonho.
    Veja bem, eu estive com ela, estávamos andando por entre nossas divertidas palavras. Ela me fazia sorrir. Me fazia chorar de rir. Eu estava feliz em um sonho real. Segurava a mão dela com força, e sei que não largaria por nada. E aquelas músicas, faziam-me sim, respirar melhor. Não serei exagerada. Eu estava bem. Ela estava bem. Nós estávamos felizes. Até que o barulho de pneus de bicicleta, se aproximavam de nossos corpos. Eram três monstrinhos. Os que me visitam três vezes por semana, quatro horas por noite. Aproximavam-se com risadas, perversidades, cheios de vida como se tivessem uma. Olhei assustada para aqueles olhos assustados, e quando menos esperei, eles tomaram-na dos meus braços. E como vampiros com sede insaciável, levaram-na, subindo os prédios com aquela bicicleta bizarra onde os quatro cabiam. Levaram-na de mim.
   Não contarei o final. Ela voltou, e machucada. Eu a encontrei, fui até ela e abracei com toda a alma. É o que os olhos do mundo precisam saber.
   Mas o que os olhos do mundo também precisam saber, é que por encontrá-la bem, gritei de um carro em alta velocidade eufórica, não me segurando mais, soltando a voz, com cabeça e lágrimas pela janela. Anestesiada por uma felicidade descontrolada, por uma ferida em carne viva quase curada...  Eu fechava os olhos...
E o que o mundo precisa (não precisa, nem necessita) saber é que eu estou loucamente adormecida e jogada por entre as estrelas lá fora.

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